quarta-feira, 23 de julho de 2008

Reflexões de uma atriz desesperada


Hoje eu me deparei com as questões que de fato assombram normalmente os atores brasileiros, bem como artistas em geral.
Estou fazendo parte de um grupo de estágios, oferecido pela famosa Cia de Teatro Fábrica, e me deparo com isso que atormenta a maioria daqueles que amam a arte e precisam acima de tudo se expressar – A FALTA DE GRANA.

Sim a Cia oferece o estágio em troca de conhecimento e não em troca de remuneração, e abriram o processo por conta da Lei de Fomento que o diretor conseguiu para a realização deste projeto, porém a verba até este ponto não é destinada aos colaboradores da montagem, no caso, nós simples estagiários.

Me pergunto, condeno a quem?

A mim? Por dentre tantas milhares de profissões ter escolhido justo uma em que se trabalha muito, inclusive aos finais de semana, e se ganha pouco, ou melhor neste caso, não se ganha nada (dinheiro)? Ou devo condenar o diretor? Que não pode pagar uma remuneração ao grupo mesmo dispondo da verba destinada ao projeto? Ou devo condenar a Lei de Fomento que não disponibilizou a verba destinada à ajuda de custo dos atores? A quem eu devo condenar? O País? O Governo?

Sim porque eu preciso assinar um contrato onde eu tenho plena consciência de que este trabalho feito por mim, e por todos os integrantes é um trabalho não remunerado, onde é necessário ter disponibilização de tempo meio período quatro dias por semana. É bastante tempo né? E o trabalho é maravilhoso, isso que da mais raiva, porque se fosse lá qualquer estudo, eu simplesmente peso meu bolso e vejo que é inviável tendo visto que alem de arcar com os custos locomoção, ainda preciso arcar com os custos de materiais que incluem livros, e copias de textos para serem lidos para as aulas, ou seja, gastei em média esse mês mais de cem reais pra trabalhar. Não ta fácil.

Sem contar que além de me super doar para compartilhar com o trabalho de atuação, onde o ator querendo ou não se mega ultra expõe, ainda percebo que existe um registro via Mini DV, ou seja, como se não bastasse estou sendo filmada.

Me questiono novamente esta errado? Eu não sei ... Autorizo o uso da minha imagem, e voz gratuitamente para registro afim de se montar um DVD com essas imagens editadas para futuras possibilidades.

Ou eu não vou assinar? To aprendendo, to trocando informações, to trabalhando com atores de diversas formações bem diferentes da minha, e vou dizer: não, não quero autorizar minha imagem, e não, não acho justo nós participarmos deste processo desta forma, sendo que não sabemos se iremos ou não, fazer parte do espetáculo com estréia prevista para o inicio do ano que vem, então tchau passar bem?

No final das contas somos brasileiros e não desistimos nunca não é? E precisamos fazer como os americanos: You gotta to do what you gotta to do!

Só me preocupo com uma coisa. Existem aqueles que acham super normal tudo isso. Achar normal trabalhar de graça e fazer uso de imagem e voz gratuitamente? Normal? Veja apenas estou me questionando até que ponto nós precisamos abrir mão do que é justo?

Não pretendo me contentar com pouco, e menos ainda pretendo achar normal. Normal pra mim é ter o que você merece. Trabalhar e receber salário pelos serviços prestados. Trabalhar de graça é caridade. Super bem vinda, mas neste caso seria melhor que fosse em prol do outro e não em prol de si mesmo, porque se não a palavra não tem significado.

Claro que não vou abandonar o barco, claro que gostaria de receber pelo trabalho, claro que gostaria de cobrar o cachê devido para o uso de minhas imagens, mas que triste que é saber que para criarmos algo tão viceral, é preciso tanto sacrifício financeiro.


quinta-feira, 10 de julho de 2008

Metamorfose


Assistindo ao filme “Ligados pelo Crime”, o narrador da primeira historia pergunta:

“Será que a borboleta ao sair do casulo, tem consciência de quão bela ela é? Ou para si mesma ela continua sendo somente uma lagarta?”

Não sei reproduzir exatamente a frase, mas essa era a questão. Se a Borboleta teria algum tipo de consciência da sua transformação em um ser imensamente mais belo que uma lagarta.

Claro que não estamos falando da Borboleta particularmente, e sim de todos nós, seres humanos cheios de defeitos e imperfeições.

Fiquei me perguntando, quantos de nós, temos de fato consciência de nossa beleza... A beleza fundamental da nossa cultura de padronização com seus corpos magros e sarados, e rostos simétricos, e a beleza interior que celebra antiguidade da nossa alma, a clareza do nosso espírito.

Será que é somente a partir do outro, como já apontava Vigostski em seus textos, que entendemos o que somos e o que representamos? Será que sozinhos não conseguimos chegar a alguma conclusão?

Será que somos cegos ou irracionais como as Borboletas e não nos damos conta da contribuição da nossa beleza no mundo? Somente a partir do olhar do outro percebemos quão belas são nossas asas e para que elas servem?

Dizem que as borboletas vivem pouco,algumas um dia, não sei.
Como se eu fosse essa Borboleta e tivesse de fato somente um dia, deixarei o aconchego do meu casulo, confortável e seguro pra poder desvendar esses mistérios.

Se durante meu vôo eu decidir pairar sobre sua superfície, aprecie a beleza de minhas asas multicoloridas, e veja se consegue desvendar para que elas servem, enquanto pensa, levanto vôo novamente rasgando o ar de vermelho, de amarelo, de laranja, de violeta....

sexta-feira, 4 de julho de 2008

Diário Fábrica - Parte I


Estou de frente a uma porta de ferro, vermelha, bem pesada e com tranca.
Faço esforço para abri-la, e dentro vejo uma sala, bem ampla, toda pintada de branco, pouco iluminada, e com três portas de madeira.
Escolho a do meio.
Esta porta abre para um corredor, um pouco estreito eu diria, e sem muita luz. Eu logo faço o teto todo se iluminar com uma luz fria, e aos poucos vão surgindo quadros na parede lateral esquerda.
O primeiro era de um artista que eu não reconheci, mas a obra me parecia famosa, em seguida veio “Guernica” de Picasso, o terceiro era um quadro abstrato de cores quentes, seguido de uma paisagem com árvores, montanhas e um lago, e o último era um caminho dentro de uma floresta. Todos bem iluminados com luzes individuais.
Ao final deste corredor mais uma porta. Eu abri, e alguns passos adiante, uma escada, descendo para um outro lugar. Um pouco mais escuro este caminho da descida, mas ainda visível ao caminhar.
Ao abrir esta porta uma parede de tijolos com uma fresta. Fiz um buraco nesta parede e vi que era uma janela. Empurrei com o braço que era tudo que cabia na fresta e o vidro da janela se abriu. Percebi que era possível sair, então quebrei muitos tijolos e consegui pular a janela. Ao lado de fora da casa, avistei um gramado bem grande, uma vista de campo, e uma pá ao lado.
Comecei a cavar um buraco na terra marrom clara. Ao cavar, não muito fundo encontrei uma chave. Uma chave antiga com ar imperial, dourada, grande e com formato de um coração todo trabalhado com um material que me parecia ouro. Guardei a chave e prosseguia meu caminho longe da casa, quando uma voz de comando, colocou três portas a minha frente.
Era como se o local onde eu estava houvesse sido paralisado por vidros blindados, e só houvesse a opção de escolher entre essas portas. Abri a da esquerda que se erguia no ar. Pensei que eu pudesse tomar o caminho para o alto, mas a voz comandou o contrario, e mesmo contra minha intuição de querer subir, eu desci mais uma vez.
A sala que cheguei possuía um alçapão no meio mais para a esquerda. Não me recordo do que havia na sala exceto o alçapão.
Abaixei para abrir essa pequena portinha de alumínio que estava colada ao chão, desci as escadas estreitas de costas para o porão. Este era repleto de objetos antigos, caixas uma em cima das outras, parecia uma garagem antiga de uma casa, repleta de memórias. Uma iluminação fraca em cada um dos cantos fazia uma penumbra lá dentro, algumas sombras, mas ainda era possível enxergar. Quase no meio desta sala a direita, mais uma porta.
Abri a porta de alumínio, com extrema facilidade, desci os degraus da escada estreita, e encostei os pés na areia. Ao lado havia uma passagem, virei e estava imediatamente em uma praia.
O dia estava lindo, ensolarado, quente e gostoso. Fui caminhando na areia branca e fofa em direção ao mar. Saldei Yemanjá, pedi permissão e entrei em suas águas. Mergulhei sem pensar, nem precisei ir caminhando sobre a areia ate que estivesse submersa, eu simplesmente me atirei ao mar.
Ao fundo viam-se muitos objetos antigos nos quais poucos eu saberia identificar o que era, fui saindo de costas para areia, e ao virar o corpo encontrei uma chupeta de cor magenta, quase nova, a mesma que usei na imaginação para escrever o roteiro de um curta metragem chamado “Diante do Mar”. Eu segurei a chupeta surpresa por tê-la reconhecido.
Um pouco mais adiante, mas ainda na beira do mar comecei a cavar, ainda onde a areia é molhada. Próximo a superfície eu encontrei um baú, antigo, preto, pequeno, me lembrava antigos baús de piratas, com aqueles detalhes em madeira e metal. O baú estava trancado, e eu usei a minha chave imperial para abri-lo. Funcionou. Ali dentro forrado com um tecido de veludo vermelho estava um diamante lapidado. Enorme, lindo e reluzente.Coloquei a chupeta dentro do baú junto com o diamante, tranquei novamente e guardei pra mim.