terça-feira, 17 de junho de 2008

Atores em teste

Estavam trinta atores sentados em roda no palco. O diretor e membros da companhia de teatro sentavam junto aos atores que estavam ali para o teste.

O exercício era simples, um ator está neutro no centro da roda, outro ator entra em cena propondo a situação. A situação tinha uma referência a algum sentimento de memória pessoal do ator, que deveria entrar em cena repleto deste sentimento e conduzir a cena.

Em meio a tantos improvisos, éramos jogados de uma cena para a outra de minuto a minuto.

O tempo é incrivelmente relativo... Um minuto de uma cena onde um ator era um personagem bêbado, e o outro tentava o expulsar do bar, pareceu uma hora. Era uma historia que não tinha para onde caminhar e eu esperei calmamente o tempo passar, totalmente entediada.
Mas quando já estava me cansando dos 60 segundos que não chegava nunca, éramos rapidamente levados para outra realidade. Até que ponto era realidade e onde entrava a ficção?

Era de fato o encontro da realidade, do ator, com a ficção proposta pelo outro ator que não vivenciou a experiência e só fazia aceitar ou não o jogo proposto.

Uma atriz entrou em cena chorando, se apresentou a outra que estava na roda, e contou sua historia. O namorado dela tinha morrido, não entrou em detalhes estava muito abalada. Outra havia sido queimada e estava com as pernas em chamas. Outro ator participou de um tiroteio, já outro fraturou uma perna num jogo de futebol, uma babá maltratou uma criança, uma adolescente era obrigada pela mãe a engolir provas quando tirava nota baixa... enfim...

Quanta coisa é possível contar em um minuto. Quantos traumas, quanta dor.

Eu percebi ao longo do exercício que as memórias mais marcantes são as ruins. Não me lembro de ter visto uma memória boa. E esse não me lembrar que é minha questão. Será que realmente não houve nenhuma cena de uma memória feliz, ou será que nos lembramos mais rapidamente das experiências tristes?

Ao acessar aquela que Stanislaviski chama de memória emotiva, o ator já acessava uma postura corporal diferente, uma fala elaborada, uma respiração condizente.

Éramos os atores em cena, mas quanto das nossas memórias de nós mesmos, seres humanos, guardamos pra nós, ou compartilhamos com os outros, e quantas.... quantas dessas memórias não se perdem em nós?

Ou quantas vezes não tentamos colocar as idéias em algum lugar seguro, mas, percebemos que já não ha segurança nem no mais alto dos pensamentos, nem nas mais escondidas emoções da alma...

Quanto de nós somos o que somos e quantos de nós apenas representamos o que somos?

Por que será que a sua historia pode ser mais interessante do que a minha? Porque uma vida pode virar um best seller enquanto outra passa despercebido pelos outros?

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